Questão
de ética
Já nos acostumamos
a falar que os políticos de nosso país são corruptos. Dizemos,
também, que o povo brasileiro é tão corrupto quanto os políticos
contra os quais esbraveja.
Alguns
teóricos, ao analisar o comportamento da população, falam em dupla
moral: um
comportamento para a vida pública pelo
qual as pessoas, quase ostensivamente, cumprem as regras e normas e
todos os princípios da moral socialmente aceita. E outro
comportamento para o âmbito particular e
privado, pelo qual o
indivíduo age pensando apenas nos seus interesses particulares,
desrespeitando toda e qualquer norma e convenção estabelecida pela
sociedade.
Nesse ponto
recordo-me da seguinte historia que fala de uma pescaria
inesquecível, propondo uma reflexão sobre retidão moral.
“Pai e filho
foram pecar no lago, próximo de onde viviam. Sabiam que a temporada
de pesca só começaria no dia seguinte. Pescariam, portanto, apenas
o que a lei permitia.
Lançaram seus
anzóis e, mais do que pescar, contemplavam a natureza e o luar que
prateava as águas.
De repente o
menino percebeu havia pescado algo. Depois de logo tempo conseguiu
erguer o anzol onde ainda se debatia um enorme peixe. Mas era um
daqueles peixes que só poderiam ser pescados depois de iniciada a
temporada de pesca.
Admiravam o peixe
quando o pai olhou para o relógio: ainda faltavam duas horas para a
meia noite, quando oficialmente começaria a temporada. Abraçando o
filho, disse:
- Você tem que
devolvê-lo às águas, filho!
- Mas, papai....
– reclamou o menino.
- Vai aparecer
outro – insistiu o pai.
- Não tão
grande quanto este – choramingou a criança.
O garoto olhou à
volta. Não havia outros pescadores ou embarcações à vista.
Novamente olhou para o pai. Não havia testemunhas. Mas a firmeza da
voz do pai indicava que se tratava de uma inegociável.
Tirou o peixe do anzol e o devolveu
às águas.
Novamente em seu
mundo, o peixe fez um rápido movimento, desapareceu. O menino sabia
que nunca mais o veria.
Os anos se
passaram e o menino, agora adulto, leva seus filhos para pescar no
mesmo lago, sempre dentro da temporada permitida. Mas nem ele nem
seus filhos jamais conseguiram pescar novamente aquele enorme peixe.
E ainda hoje, quando reconta sua história a seus filhos, acrescenta
a lição inesquecível, ensinada pelo pai: fazer o que é certo não
porque tem alguém olhando, mas porque é o correto a fazer”.
Esta historinha nos
propõe refletirmos sobre um princípio da ética e
do comportamento moral: fazer o que deve ser feito. Esse é um
imperativo moral. Deixar de fazer o que é necessário que se faça é
uma afronta à moral. É um erro fatal para com a vida social.
Por qual motivo
deve-se fazer o que tem que ser feito? Apenas porque é a coisa
certa. É necessário fazer o que é certo não porque tem alguém
vendo ou testemunhando, mas porque é a coisa certa a fazer. Isso
significa que fazer a coisa certa porque tem alguém observando não
é o correto, pois, nesse caso, não se está fazendo o que se tem
que fazer, mas o que a testemunha quer ver. O ato está sendo
realizado não porque possui um valor mas porque sua realização
renderá um elogio, uma aprovação, um reconhecimento, um benefício
pessoal.
O menino da nossa
história queria isso: não o benefício de ficar com o peixe, mas de
poder ficar com o peixe que ainda não podia ser pescado. Não queria
o peixe, mas fazer o que não podia ser feito.
Parece-nos que este
é um dos grandes problemas de nosso país. É o nosso problema: Nós
e os políticos queremos as vantagens e não os valores. Queremos os
benefícios e não fazer o que tem que ser feito.
Neri
de Paula Carneiro
Mestre
em educação, filosofo, teólogo, historiador
Rolim
de Moura- RO
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