Conta-se que naquela cidade havia um prefeito. Pessoa boníssima! Bom que não tinha rachado, como diz o gaúcho. Só não era perfeito porque não era Deus, pois dizem que Deus é perfeito...mas não é prefeito!
Mas aquele prefeito sentia-se meio deus...
O caso é que esse prefeito, em certa ocasião mandou executar uma série de obras, na cidade, beneficiando toda a população. E isso aumentou ainda mais sua popularidade!
Não que fosse vaidoso. Apenas gostava de receber elogios. Narciso no espelho d’água!
Foi nessa época que, em mais uma de suas boas obras em favor dos munícipes, mandou que se instalasse telefone na cidade. Naquela época telefone era coisa rara. Tão rara que funcionava e a gente só pagava as ligações que realmente havia feito.
Bem, o fato é que se instalou telefone na cidade. E, é claro, na prefeitura também!
E, como não poderia deixar de ser, havia um aparelho sobre a mesa do prefeito. E ele utilizava o aparelho, com freqüência: ligava para o governador, para outros prefeitos, para sua casa, para uma infinidade de lugares, a serviço ou só para “jogar conversa fora”, com costumava dizer, ao telefone.
Mas o interessante, da história não é isso. O interessante foi o que descobriu um de seus assessores.
Descobriu esse assessor que o prefeito, todos os dias, invariavelmente, chegava à prefeitura, entrava em seu gabinete, deixava a matula sobre a mesa e saía.
Postava-se debaixo dum orelhão, que mandara instalar em frente à prefeitura, e punha-se a discar, falava e ficava um bom tempo ouvindo.
Isso ainda no tempo em que os telefones públicos funcionavam com fichas...
Virou e mexeu que já estava dando o que falar!
Quase todos os funcionários da prefeitura falavam. Alguns até apostavam!
“O prefeito tem uma amante!”, “Não, ele está tramando desvio de verbas!” Ele faz ligação de lá por que se fizer da prefeitura descobrem seu esquema de corrupção!” e por aí andavam os comentários.
Antes de mais nada, o acessor era seu amigo pessoal. Depois de relutar, decidiu falar com o amigo!
- Estão falando mal do prefeito!
- Mas o quê andam dizendo?
- Prá falar pouco eles dizem que o prefeito tem alguma coisa a esconder!
- Esconder? Eu? O quê eu teria prá esconder? De quem? Por quê?
- As ligações que o prefeito anda fazendo, do orelhão! E o pior, andam falando que além do prefeito gastar muito com os telefones da prefeitura, ainda vai gastar fichinha no orelhão, ali da frente...
- Ah! É por isso! Mas não tem nada disso! Só estou fazendo pesquisa de opinião!
- Pesquisa de opinião? Mas se a questão é essa, então seria melhor contratar uma empresa especializada. Uma das suas, quem sabe...
- Prá quê gastar dinheiro à toa. Eu mesmo faço ali do telefone da frente...
- Mas não fica bem o prefeito gastar dinheiro público em fichas de telefone...
- Mas quem te disse que eu uso ficha?...
- Mas o prefeito não está fazendo pesquisa? Como, então, está fazendo para falar com os entrevistados?
- Ora essa! Muito fácil! Afinal sou prefeito! É cortesia! Simplesmente disco o número de algum dos munícipes e faço a pergunta: “Quem é o melhor prefeito desta cidade?”
- Sem colocar ficha? E daí, o que acontece?
- Eles não estão me vendo! Mas sabem que sou eu, me identificam pela voz e respondem: “TU-TU-TU-TU!”
Neri de Paula Carneiro
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